Outros gostarão dele pelo cromeleque dos Almendres, o Templo de Diana, o Convento da Conceição, onde a quase lendária Mariana Alcoforado teria (…) escrito as mais exasperadas e comoventes cartas de amor (…).
Outros ainda virão ao Alentejo pelos cavalos de Alter, os girassóis em flor dos arredores de Beja, as garças brancas dos campos de
Montemor, o ulmeiro único de Portalegre (…). Mas também se poderia descer ao Alentejo pela áspera melancolia dos corais de Vila Nova de São Bento, ou somente pelas gloriosas oliveiras de Serpa (…).
São boas razões para amar o Alentejo, mas as minhas são outras.
Os meus primeiros contactos com o Alentejo são antigos. À roda dos meus vinte e poucos anos calcorreei muito os seus caminhos, desde Niza a Mértola, desde Sines a Monsaraz, naturalmente com olhos muito mais deslumbrados do que são hoje os meus, umas vezes com o etnólogo Ernesto Veiga de Oliveira, outras tendo por companhia quem se confiava à minha juventude, que então era muito transbordante. Com o Ernesto e o Benjamim, num velho Dois Cavalos, a que chamava Rouquinho pelos frequentes ataques de rouquidão do seu motor (…)
E uma tarde chegámos a Beja com um calor que rachava as pedras e uma luz espessa e branca quase sufocante. Entrámos na pensão para um duche e um gaspacho e (…) corremos ao Convento da Conceição (…), pois trazíamos na cabeça a convulsiva beleza das cartas de Mariana (…).
Depois deste primeiro encontro, o mundo deu muita volta.
Com a freira de Beja tive de lidar de perto, pois um amigo pediu-me para traduzir as Lettres Portugaises. (…)
Voltei a Beja para o lançamento de uma das edições das Cartas (…). Fizemos então leituras no Convento e na Biblioteca, ceámos n´Os Infantes, percorremos as ruas empinadas da Mouraria, sentámo-nos na Praça da loggia florentina (…), deixámo-nos envolver, como se fora um linho fresco, pela serenidade da igrela de Santa Maria..
Só faltava descobrir o Convento de S. Francisco, transformado com inteligência e bom gosto em pousada. (…), onde me sinto como andorinha ou cegonha que regressa ao sítio onde fez ninho (…)."
Eugénio de Andrade
Que mais se pode dizer do Alentejo, que não esteja aqui tão bem reproduzido por Eugénio de Andrade? Este calor que "racha as pedra". E "uma luz espessa e branca quase sufocante"! Magnifico! Também me sinto assim, como uma andorinha ou uma cegonha que regressa ao ponto de partida. Tão verdadeiro.
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